
O
governo do Pará está prestes a autorizar o início da operação de um projeto
bilionário para explorar ouro nas bordas da barragem da Hidrelétrica de Belo
Monte, ignorando a conclusão de parecer técnico da Fundação Nacional do Índio
(Funai), que não aprova o licenciamento da mineração por conta de falhas nos
estudos de impacto às comunidades indígenas. Pessoas que acompanham o processo
dizem que a autorização sairá nos próximos dias.
Para a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) do
Pará, órgão que é responsável pelo licenciamento do projeto, não há mais nada o
que discutir sobre questões indígenas. A empresa canadense Belo Sun, dona do
empreendimento batizado como Projeto Volta Grande, que pretende ser o “maior
programa de exploração de ouro do Brasil”, já teria apresentado ao governador
do Pará, Simão Jatene, todos os dados relacionados ao assunto e discutido seus
efeitos sobre o meio ambiente e as comunidades locais.
Não é o que diz, porém, a Funai. Questionado pelo Estado, o órgão federal
reafirmou o posicionamento apontado por um relatório técnico que realizou no
fim do ano ado, com base em informações apresentadas pela Belo Sun.
A conclusão é que o estudo que trata do licenciamento ambiental “foi
considerado inapto à apresentação para as comunidades indígenas”, por não
atender a critérios básicos exigidos pela autarquia. A Funai afirma que não há
nem sequer “dados primários” sobre as duas terras indígenas mais próximas ao
local onde se pretende extrair ouro, no município de Senador José Porfírio, na
orla do Rio Xingu.
A despeito dos riscos e de impactos ao meio ambiente ou aos índios, o governo
paraense está de olho mesmo é nos números do projeto. A Belo Sun, controlada
pelo grupo Forbes & Manhattan, um banco de capital privado que investe em
projetos de mineração mundo afora, promete injetar R$ 1,2 bilhão na região. Com
explosões de dinamites, tem planos de arrancar 4,6 mil quilos de ouro por ano
do subsolo do Xingu. E isso durante duas décadas, o que coloca seu projeto no
nível das maiores explorações de ouro do País, como a da mina subterrânea de
Crixás, em Goiás, com produção anual de 6 toneladas.
Para se ter uma dimensão do projeto, dados oficias dão conta de que, nos anos
80, foram retiradas do maior garimpo a céu aberto do mundo, Serra Pelada, no
Pará, 30 toneladas de ouro.
Contas. O governo do Pará fez suas contas. Seriam 2.600 empregos diretos e
arrecadação de R$ 60 milhões por ano em royalties da mineração por 12 anos. Em
impostos, os cálculos chegam a R$ 132 milhões durante a fase de implantação e
mais R$ 55 milhões anuais quando a operação estiver a plena carga.
Os números não conseguem ofuscar, porém, a polêmica que gira em torno do
projeto, que enfrenta resistências até da própria Norte Energia, concessionária
que istra a Hidrelétrica de Belo Monte. Movimentos indígenas e ambientais,
além de o Ministério Público Federal, criticam a proximidade da mineração, que
prevê a remoção de nada menos que 37,80 milhões de toneladas de minério da área
próxima à barragem de Belo Monte.
A mineração ocorreria abaixo do eixo da barragem, numa área conhecida como
Volta Grande do Xingu. Por conta do acúmulo de água no reservatório da usina,
esse trecho do rio, que tem aproximadamente 100 km de extensão, ou a ficar
permanentemente com uma vazão mínima de água. É justamente nessa área que vivem
diversas comunidades indígenas. A preocupação é de que a exploração mineral
possa potenciar ainda mais os problemas que essa região já enfrenta.
Por meio de nota, o secretário adjunto de gestão e regularidade ambiental do
Pará, Thales Belo, afirmou que todas as comunidades indígenas da região vivem
acima do raio de 10 quilômetros do projeto, parâmetro legal usado para
estabelecer quando um empreendimento tem “impacto direto” sobre as terras
indígenas. De acordo com o governo do Pará, as comunidades indígenas estão a 12
e 16 quilômetros do local de atuação da empresa.
A Belo Sun não respondeu ao pedido de entrevista. Em sua página na internet,
com conteúdo apenas em inglês, a empresa convida investidores para entrar em
negócio com “tremendous” potencial no Brasil. Há cinco anos, os canadenses
tentam liberar a exploração. O projeto já conseguiu obter sua licença prévia da
Semas, documento que garante a viabilidade ambiental da exploração. Em abril do
ano ado, o governo do Pará chegou a anunciar uma cerimônia na qual a
licença seria emitida. Porém, o anúncio foi adiado após alguns dias.